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‘O princípio do coração’ encerra a trilogia de Helen Hoang de um jeito pouco romântico

Continuação traz a história de Quan Diep, aguardada pelo público que o acompanhou duas vezes como coadjuvante, mas se aprofunda em nova personagem

Sucessor de O teste do casamento (Paralela, 2022), O princípio do coração (Paralela, 2023) fecha a trilogia aclamada pelos fãs de forma inesperada. Seguindo a proposta dos seus antecedentes, a protagonista Anna Sun está dentro do espectro autista e também tem ascendência asiática, nesse caso chinesa. Ela contracena com o personagem mais aguardado pelos fãs dos livros anteriores: Quan Diep, irmão de Khai Diep e primo de Michael Phan, de Os números do amor (Paralela, 2022).

A história engata quando o namorado de Anna, Julian, decide que é melhor para o casal viver um relacionamento aberto. Assim, a jovem violinista entra em um aplicativo de encontros, onde conhece Quan, que também viveu uma grande mudança e está em busca de pessoas novas. Apesar da vontade, os encontros não dão exatamente certo, mas Anna e Quan parecem ter uma conexão significativa e fazem de tudo para ficar juntos.

O casal sai em alguns encontros que, no início, tem um intuito puramente sexual, mas isso se mostra  um problema ao longo da história [Imagem: Reprodução/Instagram/@eklixio]

Menos romance, mais drama

Dentre os três livros, esse é o que mais deixa o romance em segundo plano. Um problema abate a família de Anna que, prestativa, deixa tudo de lado para estar com seus pais e irmã. Grande parte do livro gira em torno das dificuldades que a protagonista enfrenta com a família que, além de estar em um momento delicado, é muito rígida e conservadora, o que faz com que o romance entre Anna e Quan não seja  o foco, como acontece com Michael e Stella e Khai e Esme nos livros anteriores. 

Este é um livro maduro que foge da zona de conforto que é costumeira nas comédias românticas, que servem de comfort book para muitos leitores. Ao tratar temas sensíveis como capacitismo, doenças graves e a cobrança da família, Helen escolheu um caminho diferente para finalizar a trilogia, complexificando as relações. Apesar de não ter agradado alguns fãs, fazendo com que esse seja o livro pior avaliado na trilogia, a estratégia de fugir dos padrões românticos cria um ambiente mais maduro e reflexivo para a história. 

É este ambiente que possibilita o florescer da personalidade de Quan, que se mostrou diferente do que foi visto nos livros anteriores. Apesar de ainda ser o jovem brincalhão de antes, o tempo e seus acontecimentos, abordados de maneira séria e responsável no livro, renderam ao personagem mais inseguranças, que alteram muitos de seus comportamentos. Quan é um personagem muito bem construído, maduro e sensível, e não é difícil se apaixonar por ele e por sua história ao decorrer da leitura. 

Quan se mostra um personagem compreensivo e está sempre apoiando Anna [Imagem: Reprodução/Instagram/@eklixio]

Uma perspectiva íntima

Diferentemente dos outros livros, este possui a narração em primeira pessoa, o que aproxima o leitor ainda mais dos pensamentos e, consequentemente, das motivações dos personagens, que parecem mais corpóreos. Em suas notas finais, a autora conta que essa foi uma escolha muito pessoal, pois o livro foi “uma obra de ficção, mas também em parte uma autobiografia” e “as palavras fluíam melhor quando eram ditas por um ‘eu’ ao invés de ‘ela’’’. Toda essa atmosfera faz com que o leitor acompanhe intimamente a trajetória e evolução de Anna, assim como seu sofrimento. O caráter pessoal dado pela autora, que se vê na personagem, dá um  tom sensível à leitura, que se assemelha a de um diário.  

As situações vividas por Anna são, em grande parte, revoltantes. Sua família parece não compreendê-la e tem atitudes desagradáveis, o peso da expectativa sob os ombros da protagonista é quase sensorial. Além do problema com o namoro, a aproximação com Quan e a questão familiar, Anna também vive um conflito artístico e profissional, pois não consegue mais se apresentar com o violino. Tudo isso faz com que o foco da narrativa esteja principalmente na protagonista feminina, o que quebrou a expectativa de uma parte do público, que esperava um maior destaque para Quan. 

Alguns pontos no livro são mal desenvolvidos, mas isso não afeta a história de maneira grave. O desenvolvimento do enredo ganha pontos por fugir dos recursos narrativos que geram conflitos entre os personagens e costumam se basear em falhas de comunicação simples, optando por trazer questões mais reais e profundas. Por fim, o livro é envolvente. Não é uma boa escolha para quem busca um romance fulminante como em Os números do amor, no entanto, é uma alternativa para quem gosta de acompanhar assuntos mais complexos sem abandonar o romantismo. Vale ressaltar que este livro possui conteúdo adulto e não é recomendado para menores de 18 anos. 

*Imagem de capa: Acervo pessoal/Nicolle Martins

1 comentário em “‘O princípio do coração’ encerra a trilogia de Helen Hoang de um jeito pouco romântico”

  1. Excelente resenha! Escrita muito boa de leitura fluida e encadeamento das ideias de fácil compreensão!

    Quanto a estória em si: Me pareceu seguir a linha moderna longe dos relacionamentos tradicionais, recheada de extremos. A escrita em primeira pessoa traz uma experiencia ao leitor mais próxima dos fatos.

    Se era uma marca registrada a figura masculina como protagonista, firme em suas atitudes e de repente se exalta a figura feminina e demonstra a figura masculina de forma fraca, com problemas existenciais, está aí uma clara inversão de valores e realmente fica muito esquisito.

    Após experimentar os extremos, fica claro pro leitor que o que há de tradicional e natural a todo ser humano no final sempre prevalece.

    Um pedido: Faça uma resenha do livro de Flober Madame Bovary

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