Jornalismo Júnior

Página inicial
Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors

Festival Filmelier no Cinema | ‘A Noite do Dia 12’: o mal combatido com relatórios

Baseado em fatos reais, filme francês mostra como policiais enfrentam não só o crime, mas também a realidade da masculinidade tóxica

“Talvez nenhum seja o assassino, mas cada um pode tê-la matado”. É a essa conclusão que chega um desolado Yohan Vivès (Bastien Bouillon) sobre o seu primeiro caso após ser promovido a capitão de polícia. Protagonista de A Noite do Dia 12 (La Nuit du 12, 2022), Yohan encontra o destino anunciado por um dado logo no início do filme: na França, ao ano, de cerca de 800 casos de assassinato, quase 20% nunca são solucionados, e essa é a história de um deles.

O filme francês, dirigido pelo alemão Dominik Moll, faz parte do Festival Filmelier no Cinema, que ocorre entre os dias 19 de abril e 10 de maio e traz a várias cidades brasileiras 20 filmes inéditos e diversos. A Noite do Dia 12 é adaptado do livro 18.3: Une Année à la PJ (Folio, 2020), obra de não-ficção da novelista e roteirista francesa Pauline Guéna. O longa foi o grande vencedor do último César Awards, prêmio considerado o Oscar francês, levando seis das dez categorias em que foi indicado: Melhor Filme, Melhor Diretor, Melhor Ator Coadjuvante (Bouli Lanners), Ator Mais Promissor (Bastien Bouillon), Melhor Adaptação e Melhor Som.

A trama se passa em Saint-Jean-de-Maurienne, pequena cidade na França a uma hora de Grenoble, onde trabalham os policiais. [Imagem: Divulgação/Pandora Filmes]

Se em um drama policial o espectador espera encontrar um clássico whodunnit (estilo de trama investigativa de “quem fez isso?”, em português), A Noite do Dia 12 pode deixar um gosto amargo por abordar um crime sem resolução. No longa, o foco está em como a morte chocante da jovem Clara (Lula Cotton-Frapier) impacta nas vidas de amigos, família, casos amorosos e, sobretudo, do corpo policial. 

Ainda assim, o caso não é o centro de tudo: a vida de Clara foi ceifada, mas as demais seguem. Todos passam por dramas pessoais e o desenrolar das investigações é apenas um aspecto do cotidiano dos muitos (e, por boa parte do filme, exclusivamente) homens da delegacia. Visivelmente entrosados, os policiais seguem os protocolos de maneira competente e revelam ao espectador um trabalho que geralmente não aparece nos filmes mais voltados para a ação: colher relatos, ouvir gravações, fazer relatórios e lutar contra a impressora velha e a falta de financiamento para seus planos. 

Eles comem, fazem piadas e, embora estejam em “apenas mais um caso”, o filme mostra com maestria a forma com a qual as histórias não acontecem uma a uma, com começo, meio e fim. A vida não paralisa para a solução do caso, ele é o pano de fundo para as histórias que cada um está vivendo no momento e ambos se afetam mutuamente. Para Yohan e seu braço direito na delegacia, Marceau (Bouli Lanners), isso terá implicações mais dramáticas, mas ainda assim construídas de forma lenta e factível. Não é um filme de acontecimentos grandiosos e tramas emaranhadas, mas de processos.

As poucas personagens femininas têm clareza do que está acontecendo no caso Clara, vítima não só do seu algoz, mas da misoginia. [Imagem: Reprodução/YouTube/IMDb]

Além da luta contra o tempo – nestes casos, as primeiras semanas são as mais importantes para a resolução –, outra batalha é a dos homens com suas próprias masculinidades e sua misoginia enraizada. Com o assassinato violento, os principais suspeitos são homens com quem Clara se relacionara, e a opinião dos policiais sobre a sua vida amorosa influencia na maneira com a qual conduzem as investigações. As poucas mulheres no filme veem isso de forma nítida e não medem suas palavras ao chamar atenção de Yohan para o machismo intrínseco em muitos dos seus raciocínios.

Yohan, taciturno e abalado, enfrenta o conflito de se ver como homem no meio de uma trama na qual está claro que todos os homens com os quais conversou são possíveis culpados e, mesmo que não o sejam, ainda machucaram Clara de diversas formas. Em um trabalho impressionante, Dominik Moll usa de várias sobreposições de imagens, bem como de sons que vão além da trilha sonora, para trazer à tona esses conflitos internos. 

Marcado por sua abordagem diferente do processo da investigação criminal, A Noite do Dia 12 se desenrola da mesma maneira que o caso: tudo parece caminhar para uma resolução, mas pistas que levam a becos sem saída, ruídos de acontecimentos desimportantes e a própria passagem do tempo deixam tudo suspenso. O desfecho pode não agradar quem, embalado pelo clima true crime, também busca por justiça para uma Clara que aparece pouco, mas quando o faz cativa. No entanto, o filme é fiel e realista ao retratar um dos muitos casos não resolvidos na vida real e o modo como o roteiro conta essa história e a escolha do diretor de contá-la são notáveis.

No mundo policial, se diz que “todo investigador é assombrado por um crime”. E este é o caso de Yohan.

O filme faz parte do Festival Filmelier no Cinema, confira o trailer:

*Imagem de capa: Divulgação/Pandora Filmes

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima