Jornalismo Júnior

Página inicial
Generic selectors
Exact matches only
Search in title
Search in content
Post Type Selectors

Amazônia está perdendo sua capacidade de absorver gás carbônico, indica estudo

Pesquisa conduzida por cientista brasileira do Inpe constatou que apenas 18% das emissões de queimadas estão sendo absorvidas pela floresta.

Um estudo publicado na revista científica Nature na última quarta-feira (14) revelou que a Amazônia está emitindo mais gás carbônico do que absorve, principalmente em regiões que apresentam maior degradação ambiental. Fatores como desmatamento, queimadas e mudanças climáticas têm contribuído para esse cenário.

A pesquisa, desenvolvida pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), liderada pela pesquisadora Luciana Gatti, analisou amostras de ar de quatro localidades da Amazônia entre 2010 e 2018. Descobriu-se que a emissão de carbono foi dez vezes maior nas regiões com mais de 30% de desmatamento do que naquelas com desmatamento inferior a 20%. Com isso, a floresta emite por ano 0,29 bilhão de toneladas de carbono a mais do que consegue absorver.

Imagem resumo do estudo, representando os fluxos de carbono na Amazônia
As localidades leste (representadas por SAN e ALF), que são as mais desmatadas, apresentaram maior emissão de carbono do que as localidades oeste (representadas por TAB, TEF e RBA), menos desmatadas. [Imagem: Reprodução/Luciana Gatti]

Em entrevista ao Laboratório, Gatti explica que esse processo ocorre mais intensamente na porção leste da floresta, com destaque para o sudeste – sul do Pará (PA) e norte do Mato Grosso (MS) –, onde há a maior extensão de áreas queimadas e desmatadas. Nesta região, “a própria floresta está emitindo mais carbono do que está absorvendo”, principalmente durante os meses da estação seca, como agosto, setembro e outubro.

Pesquisadora Luciana Gatti, do Inpe, que liderou o estudo
[Imagem: Reprodução/Luciana Gatti]
Gatti ressalta que a estação seca está ainda mais seca, quente e longa na região, pois a retirada da cobertura vegetal tem propiciado a redução da evapotranspiração – processo em que as plantas transpiram, devolvendo para a atmosfera a água que absorvem do solo. Assim, chove menos, pois há menos vapor d’água na atmosfera para formar a precipitação. Tudo isso contribui para o aumento da temperatura e para o prolongamento da estação seca.

Emissão indireta de carbono 

Embora as queimadas sejam as principais responsáveis pela emissão de gases do efeito estufa no bioma, a própria vegetação também tem emitido mais gás carbônico no sudeste da floresta. Gatti explica que as espécies vegetais da Amazônia são espécies próprias de regiões que têm água em abundância e temperatura amena. Logo, mudanças climáticas, como escassez hídrica e elevações de temperatura, representam uma condição de estresse para a vegetação.

A falta de água, em especial, pode ocasionar a morte das árvores, pois prejudica seu crescimento e seu desenvolvimento. Com a mortalidade acentuada, há também mais decomposição de matéria orgânica, processo que libera carbono na atmosfera.

Gatti ainda explica que o estresse no ecossistema prejudica a fotossíntese: “Algumas espécies de árvore hibernam,  interrompendo ou reduzindo a fotossíntese, mas continuam respirando, então há um desbalanço, porque ocorre mais respiração do que fotossíntese”. Em outras palavras, algumas árvores estão “poluindo” o ar ao invés de limpá-lo, já que liberam mais carbono (pela respiração) do que absorvem (pela fotossíntese).

Além disso, espécies que precisam de menos água para sobreviver e que se adaptam melhor a temperaturas elevadas podem tomar o lugar das espécies típicas de floresta tropical úmida. “São as espécies mais resistentes a essa condição estressante que irão sobreviver e sobressair na floresta. Acontecerá uma troca de espécies, em que as mais resistentes se tornam mais abundantes e as menos resistentes vão perecendo. Essa é a famosa savanização da Amazônia”, alerta a pesquisadora. 

Metodologia: análise da atmosfera na Amazônia

Segundo a pesquisadora, estudos feitos anteriormente analisaram a concentração de gases em locais específicos na superfície da floresta, não sendo capazes, contudo, de obter uma média do fluxo de carbono representativa do bioma como um todo.

Tendo isso em mente, os pesquisadores do estudo recém-publicado optaram por analisar, ao longo de quase uma década, a atmosfera de quatro regiões distintas: nordeste, sudeste, sudoeste e noroeste da Amazônia.  “Escolhemos essa estratégia por ela representar realmente a maior parte da Amazônia, e também escolhemos fazer um estudo de longo tempo porque, ano a ano, as emissões e absorções de carbono na floresta mudam muito.”

Foram realizados aproximadamente 600 voos utilizando avião de pequeno porte a fim de coletar oito mil amostras ao longo de colunas de ar que se estendiam de aproximadamente 300 m da superfície até 4,4 km de altura. Após a coleta, analisava-se em laboratório o teor de gases do efeito estufa nas amostras de ar.

Equipe e avião de coleta [estudo Amazônia Inpe]
Cientista Luciana Gatti e equipe em uma das coletas de amostra de ar. [Imagem: Reprodução/Luciana Gatti]

O que fazer agora?

Gatti defende duas medidas para frear a transformação da Floresta Amazônica em uma fonte de carbono. A primeira delas é a criação de programas de recuperação florestal que contem com esforços nacionais e internacionais para recuperar áreas degradadas. A segunda é a proibição das queimadas nos meses mais secos (de julho a novembro), uma vez que, nesse período, a diminuição das chuvas torna a vegetação mais seca e, consequentemente, mais inflamável. Isso possibilita que o fogo das queimadas em áreas desmatadas adentre também a parte da floresta que não foi desmatada.

“No balanço global, a Amazônia é tida como responsável por 20% da remoção do gás carbônico no globo inteiro. Estamos vendo que essa absorção é muito menor hoje do que se acreditava. Isso implica que a natureza está compensando menos as emissões humanas e que o nosso esforço em reduzir a emissão gases de efeito estufa tem que ser maior, muito maior”, afirma.

*Imagem de capa: Bruno Kelly/Amazônia Real.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima