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Cadê Você, Bernadette? Retrato e resgate da criadora adormecida

“Pessoas como você precisam criar. Sem criar, você se torna uma ameaça para a sociedade”, sugere um colega de longa data à protagonista, em cena que apresenta ao espectador certa síntese da vida dela até ali. Bernadette Fox (Cate Blanchett) foi uma arquiteta brilhante, premiada pela originalidade de suas soluções sustentáveis, mas que vive uma …

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“Pessoas como você precisam criar. Sem criar, você se torna uma ameaça para a sociedade”, sugere um colega de longa data à protagonista, em cena que apresenta ao espectador certa síntese da vida dela até ali. Bernadette Fox (Cate Blanchett) foi uma arquiteta brilhante, premiada pela originalidade de suas soluções sustentáveis, mas que vive uma pausa na carreira há 20 anos.

O longa, dirigido por Richard Linklater, é uma adaptação do best-seller de Maria Semple e apresenta uma mulher que esconde seu eu artista em crise sob a monotonia de um cotidiano banal. Em Cadê Você, Bernadette? (Where’d You Go, Bernadette, 2019), sobressaem-se as relações familiares e a busca de Bernadette por um sentido maior. O resultado é uma narrativa acolhedora, como um abraço no espectador. 

Entre noites de insônia e o estado constante de ansiedade, Bernadette é completamente focada na família. Seu cotidiano não vai muito além do cuidado com a filha Bee (Emma Nelson), com quem nutre uma ótima relação, e com Elgie (Billy Crudup), o marido workaholic e pouco presente. Além deles, algumas figuras da vizinhança são motivo de distração e desgaste para ela, sobretudo a azucrinante Audrey (Kristen Wiig), que também funciona como alívio cômico na história.

Bee é uma estudante focada que está prestes a entrar para um renomado internato. Por isso, pede aos pais, como celebração, uma viagem à Antártida. Viajar até o Polo Sul do globo e lidar com situações desconfortáveis e a presença de tantos desconhecidos não é uma escolha fácil para Bernadette, devido à sua agorafobia — distúrbio de ansiedade relacionado ao medo de lugares e situações que podem causar pânico. Mas, diante o apelo da filha e a saudade antecipada, acaba aceitando. A viagem se torna a principal preocupação da protagonista, que fica evidente no contato que mantém com Manjula, uma espécie de assistente pessoal com quem só se comunica virtualmente. Nos longos e-mails que escreve a partir da ferramenta de voz, Bernadette apresenta as exigências para a viagem e desabafa suas inúmeras aflições. Aqui, Blanchett brilha, em monólogos que transparecem a inquietude do interior de Bernadette.

[imagem: Wilson Webb / Annapurna Pictures]

Enquanto o clímax não chega, a narrativa desenvolve a relação de cumplicidade entre mãe e filha. Em uma cena marcante e de grande carga emocional, Bee e a mãe performam a clássica canção Time After Time, de Cindy Lauper. O desgaste de Bernadette fica evidente quando ela confessa a dificuldade de lidar com a “banalidade da vida”. Também faz parte das angústias da mulher uma certa negligência acumulada do esposo para com ela e a filha.

A busca por Bernadette, indicado no título, ocorre em dois sentidos: em menor medida, o desespero da família quando a mulher de fato desaparece; em maior, a busca por si própria e alguma renovação. Um acidente (envolvendo Bernadette) que destrói a casa de Audrey e um descuido da protagonista que quase coloca a família em risco integram os acontecimentos que a levam ao sumiço. Ironicamente, a vizinha tem um papel importante nesse momento, e é interessante a reconciliação entre as duas, ainda que brevemente retratada.

E Bernadette some, para então se encontrar. De forma inusitada, acaba resgatando a artista que há muito estava dormente. Mergulha atrás de algo que, pela primeira vez em muito tempo, instiga sua alma e lhe desperta a urgência de criar. A jornada em questão é mais curta do que o esperado, diferente do que se imagina a partir da proposta do filme. A busca por Bernadette ocupa curto tempo de tela, o que acaba por comprometer um pouco o desenvolvimento do enredo e a resolução dos conflitos — tudo acaba soando muito súbito.

[Imagem: Divulgação]

Outro ponto incômodo é a abordagem rasa da temática da saúde mental. Apesar do esforço dos personagens em reconhecer que Bernadette precisa de ajuda, e do tom leve aplicado nessa discussão (que, por condizer com o tom geral do filme, é positivo), não há aprofundamento ou alguma conclusão. O tema é rapidamente deixado em segundo plano, como se depressão e ansiedade não fossem questões urgentes, e as soluções viessem de forma fácil. 

Cadê Você, Bernadette? conta uma boa história, e é ideal para quem busca se divertir e se emocionar sem, no entanto, esperar por grandes reviravoltas ou um enredo grandioso. Os momentos de alívio cômico são apropriados e vêm na medida certa; e é especialmente satisfatório acompanhar Blanchett, em mais uma ótima atuação, dando vida à Bernadette e sua busca por ressignificação.

O filme estreia dia 7 de novembro no Brasil. Confira o trailer:

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