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Uma lição sobre alteridade e amadurecimento em Mulher Maravilha

  Mulher Maravilha (Wonder Woman, 2017) é lançado com grandes expectativas a atender: carregando o mérito de ser o primeiro filme com a liderança de uma super heroína e também com a direção de uma mulher, ele tem a responsabilidade de garantir ao seu público feminino uma personagem forte e respeitada que o cinema tanto …

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Mulher Maravilha (Wonder Woman, 2017) é lançado com grandes expectativas a atender: carregando o mérito de ser o primeiro filme com a liderança de uma super heroína e também com a direção de uma mulher, ele tem a responsabilidade de garantir ao seu público feminino uma personagem forte e respeitada que o cinema tanto precisa. No entanto, após o fracasso de Batman vs Superman (Batman v Superman: Dawn of Justice, 2016), o longa também precisa recuperar o lucro e a boa reputação dos filmes da DC. Foi prometendo servir tais demandas que a equipe de Patty Jenkins e Zack Snyder entregaram 140 minutos dinâmicos de humor, ação e sutis reflexões sobre o ser humano e os padrões sociais.

A israelense Gal Gadot dá vida a Diana, uma jovem idealista e corajosa que ainda carrega certa inocência anterior à sua transformação na heroína que hoje conhecemos como Mulher Maravilha. Ela vive em Themyscira, ilha abençoada pelos deuses do Olimpo e habitada por mulheres conhecidas como amazonas. Diana entra em cena ainda como uma criança travessa que almeja lutar como sua tia, a general do exército das amazonas, Antíope. Mas é impedida por sua mãe, a rainha Hipólita. Esse seu temor em iniciar o treinamento da filha induz o espectador a duvidar da aparente paz que reina na ilha.

Com o intuito de afastar a filha do treino de guerra, Hipólita introduz uma história que irá moldar a personalidade e o destino de Diana. Ela conta da criação da humanidade por Zeus e do ódio que Ares, o Deus da Guerra, nutre por ela; Ares, por sua vez, tenta corromper os seres humanos, incitando guerras e discórdia entre eles. As amazonas foram, então, criadas por Zeus para devolver à humanidade o amor e a harmonia.

No entanto, tal conto só serviu para estimular em Diana um forte sentimento de compromisso com a causa, motivando-a a treinar suas habilidades incessantemente, ajudada pela tia Antíope, até tornar-se adulta.

Sua formação como guerreira já está quase completa quando algo inesperado irrompe a pacífica ilha: um avião surge no céu e, diante dos olhos curiosos de Diana, cai no mar de Themyscira, carregando consigo o piloto americano Steve Trevor (Chris Pine). Com sua chegada, as amazonas tomam consciência da enorme guerra que vêm ocorrendo no mundo exterior: é a Primeira Guerra Mundial. Na certeza de que o conflito estaria sendo movido por Ares, Diana decide abandonar sua terra e partir com o americano para o combate.

Durante a longa jornada, as interações entre Diana e Steve acabam rendendo ótimos momentos de humor, que ocorrem de forma natural e confortável, sem se tornarem forçados em momento algum. Este humor é proporcionado principalmente pelo contraste entre a cultura na qual Diana cresceu – regada por valores da antiguidade clássica greco-romana, mas também com uma grande liberdade e autonomia feminina – e a cultura contemporânea vivida por Steve, envolta de grande avanço tecnológico mas, também, com grandes imposições sociais às mulheres da época.

É principalmente por esse contraste que o filme consegue levantar pequenas reflexões sobre liberdade sexual, machismo e estereótipos de gênero. Diana indaga constantemente as limitações da sociedade contemporânea, como quando tem de se submeter a usar roupas típicas da Londres do século XX, que julga desconfortáveis e impróprias para a luta. Esse questionamento dialoga perfeitamente com o cenário em que se dá o filme – na Primeira Guerra, e não na Segunda, como ocorre nos quadrinhos -, pois é nesse período que a discussão sobre os direitos das mulheres ganha maior popularidade, principalmente com a conquista do direito ao voto.

Não é apenas essa questão social abordada pelo filme. Três personagens entram em cena como colegas de Trevor e representam grande parte da diversidade do filme: um contrabandista nativo americano, um atirador escocês e um charlatão árabe. Além de servir de grande ajuda para a dupla, são eles que introduzem sutilmente observações sobre o racismo, o genocídio do povo nativo-americano pelos ingleses na colonização, e até mesmo o transtorno de estresse pós-traumático ocasionado pela guerra. Por mais que seja um filme de ficção heróica ambientado no século XX, ele se mistura com discussões muito atuais, mantendo diálogo com a sociedade de hoje.

No entanto, não são todos os personagens que conseguem trazer grande interesse ao filme. O general alemão Ludendorff, por exemplo, é um vilão extremamente unidimensional, que falha em amedrontar ou mesmo em ser levado a sério pelo público. Ao contrário de Dr. Poison, química do exército alemão que trabalha ao seu lado, ele não demonstra a humanidade que o filme tanto busca evidenciar em cada pessoa; ele é apenas mau, a todo o tempo. Apesar desta falha, o longa tem uma interessante posição em quebrar a polarização entre heróis e vilões em filmes do gênero, atentando para a complexidade da guerra e de cada pessoa envolvida nela, ao contrário da simplicidade do pensamento de Diana ao culpar apenas Ares pelo conflito.

Outra falha do enredo, talvez ainda mais preocupante, consiste na construção do romance entre Diana e Steve. Ele é introduzido logo ao primeiro contato dos dois, de forma incrivelmente artificial e repentina. O romance reaparece em outras cenas e, mesmo nelas, não convence o espectador do motivo de sua existência no longa. Caso a relação entre ambos se restringisse a uma profunda e pura amizade, sua contribuição para a construção do caráter de Diana e para o fator de emoção do filme seria a mesma, ou até maior.

Esta questão, inclusive, faz o filme cair no clichê da personagem feminina sempre tendo de estar atrelada a um personagem masculino de alguma forma – o que não combina com o caráter feminista e progressivo prometido por seus produtores. A Mulher Maravilha não precisa estar conectada romanticamente a um homem para ter seu valor reconhecido. Ela é importante por si só.

Mulher Maravilha é, sobretudo, um filme sobre amadurecimento. Mais especificamente, sobre um duplo amadurecer da protagonista: ela, antes mesmo de conhecer o mundo, aprende sobre si mesma. Conhece sua força, seus poderes e seu potencial de transformação. Mas é no decorrer da trama, no entanto, que a inocência idealizadora de Diana, de querer consertar uma sociedade corrompida pelo mal, é substituída pela consciência de suas limitações. Nem mesmo a Mulher Maravilha consegue libertar o mundo de todo o mal – mas isso não a impede de continuar tentando.

Mulher Maravilha estreia dia 1 de junho. Veja o trailer!

por Juliana Santos Laura Molinari
jusantosgoncalves@gmail.com | lauratmolinari@gmail.com 

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